sábado, 11 de setembro de 2010

Por uns cinemas de rua a mais


A galera mais novinha que hoje vai ao cinema no Largo do Machado e só tem como opção as salas do São Luíz localizadas dentro de uma galeria, nem imagina que por ali já existiram vários cinemas. O Politheama foi um exemplar dos ‘poeiras’ e funcionava ao lado de onde hoje é o Bob’s, o Azteca ficava na Rua do Catete, entre a Corrêa Dutra e a Buarque de Macedo e tinha uma arquitetura com motivos chicanos, tendo sido inaugurado em 1951, muito pra escoar a prestigiada produção cinematográfica do México da década de 40. A sessão inaugural foi com a fita ‘D.Diabla’, com Maria Félix. Infelizmente, um incêndio detonou os arquivos sobre o local. Já o São Luiz, que tem esse nome devido ao seu dono, o Sr. Luiz Severiano Ribeiro, foi um projeto visionário pra época, pois seria a primeira das casas de luxo situada para além do Centro, mais precisamente, da Cinelândia. Inaugurado em 1937, com uma programação musical seguida da sessão de ‘Ela e o Príncipe’, com Tyrone Power, logo virou o must do bom gosto carioca e os frequentadores costumavam comparecer às sessões de paletó, colarinho e gravata. O fato é a casa pedia esse tipo de apreço indumentário: a sala de projeção era em formato de concha acústica, a sala de espera, um luxo só, cheia de espelhos, mármores e plantas vivas, e até mesmo a revista Fonfon (Jan/1938), especializada em ditar tendências, chegou a definir o cinema como o grande propulsionador da indústria cinematográfica brasileira, pois permitia que o carioca, antes de ir à praia, visse seus artistas prediletos num cinema confortável e moderno. Sim, porque naquele tempo, a boa era a sessão dedicada às pré-estreias, nos domingos, sempre às 10h. Inclusive, quando ‘Rock around the clock’ foi exibido, Bill Halley, o protagonista, veio ao Rio somente para a ocasião, incitando a galera do rock, que, em transe, chegou a arrancar cadeiras e a encher os banheiros (femininos, naturalmente) de inscrições animadinhas feitas com batom vermelho. O último filme que passou no São Luiz foi ‘Apocalipse Now’, em 1980, imediatamente antes da demolição de sua bela edificação por conta do metrô. Depois de encerradas as obras, o São Luiz ressurge já nesse shape, dentro de uma galeria. Agora um fato que não me sai da lembrança: dentro da Galeria Condor tinha um cinema, o Largo do Machado, onde eu, louca pelo John Travolta, falsifiquei, junto com uma amiguinha, a carteirinha da escola pra passar por 14 anos e ver ‘Os embalos de sábado à noite continuam’. Isso aconteceu na década de 80, mais precisamente em 84 e o lanche depois da sessão foi no Bob’s, numa época em que o sanduíche de queijo com banana arrasava no recreio. Hoje em dia, esse cinema foi mais um que virou igreja evangélica, o que nos leva a pensar que, mesmo localizado dentro de uma galeria sem glamour nem perfumaria, o São Luiz é um dos representantes da resistência ao genocídio cultural das salas de rua.
Fonte:
.PEREGRINO, Umberto: Crônica do bairro do Catete: histórias e vivências. RIO ARTE, 1986.

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