quarta-feira, 1 de setembro de 2010

A arquitetura dissecada: Igreja, estátua, bonde e cinema.


Carlota Joaquina em sua estada tupiniquim fundou duas pequenas capelas nos arredores do Largo: uma no “Caminho Novo de Botafogo” (hoje Rua Marquês de Abrantes) e outra na Rua das Laranjeiras, ambas (não por acaso) em logradouros onde tinha estabelecido residência própria. Assim, tão logo se criou a Paróquia da Glória (1840), a capela da Rua das Laranjeiras foi convertida em Igreja da Matriz. Não essa que vemos hoje, com um ponto de ônibus na frente, torre e batistérios, mas a inicialmente projetada em 1842, em estilo neoclássico e inspirada na St. Martin Church de Londres. Paralelamente, em 1869, o Largo foi ajardinado à francesa (com figueiras e palmeiras reais) e gradeado (com chafariz central) pelo paisagista Auguste Marie François Glaziou, tendo permanecido com a mesma conformação até 1897, quando teve seu chafariz central substituído pela estátua equestre de Duque de Caxias. Sobre essa coisa das estátuas, cabe um aparte, que pode parecer tolo, mas que, de todo modo, vale, nem que seja como flashback: naquele tempo, há mais de um século atrás, antes de todo o bombástico fetiche midiático provocado pelo cinema e pela televisão, as estátuas tinham o poder de cravar no imaginário coletivo feitos e acontecimentos que muitas das vezes soavam muito mais heróicos do que de fato haviam sido. Pois bem, em 1949, a tal estátua equestre de Duque de Caxias tomou seu rumo definitivo (em frente ao Palácio Duque de Caxias, no Campo de Santana) e deu lugar a um chafariz feito de cimento e mármore, onde lá no alto figura a valiosíssima estátua da Virgem da Conceição, toda trabalhada no mármore italiano por Antônio Canoa e doada pelo Vaticano à Arquidiocese do Rio. Podemos atribuir à distância entre o chão e a Santa a façanha da mesma continuar intacta ao longo de meio século. Mudando um pouco de assunto e detalhando um post anterior deste blog intitulado ‘Os bondes’, a “Companhia Ferro Carril do Jardim Botânico”, inaugurada em 1862, foi demolida em 1938, tendo em seu lugar sido construído o Cinema São Luiz, inspirado em um similar da Broadway. Essa edificação glamourosa acabou sendo posta abaixo pelas obras do Metrô da década de setenta e dando lugar, posteriormente, a um centro comercial com dois cinemas dentro. Ali nos arredores, sempre acompanhando a movimentação cinematográfica, vem o lendário restaurante ‘Lamas’ (hoje localizado na Rua Marquês de Abrantes), conhecido por nunca fechar suas portas e por ser freqüentado, há mais de um século, por uma boemia seleta, incluindo aí a conhecida ‘Geração Paissandu’, composta por politizados cinéfilos frequentadores da vizinha (e homônima) sala de cinema na década de 60.

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