quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Tapume, mendigos, turistas e pamonhas




Como qualquer outra paisagem, o Largo do Machado vai mudando de acordo com o horário. Ontem, passei em torno das 22h e encontrei tudo ainda bem lotado: os bancos em frente à escola, as mesas da jogatina, o ponto de ônibus (primeira foto) e a circunferência do chafariz. Até no pequeno parquinho com balanços quebrados tinham crianças brincando. Inclusive, na hora em que eu saía do metrô, percebi um movimento que deve se repetir todos os dias: o das pessoas que vão pegar a integração subindo a escada rolante correndo pra não perder o ônibus, que provavelmente tem hora certa pra sair. Apesar da (ainda) grande quantidade de gente, a postura das pessoas não é a mesma que de dia. Todo mundo anda um pouco mais rápido, mais atento, pois em vários trechos (como o entorno do stand de castração gratuita de animais), a iluminação é inexistente. Só os turistas mantêm aquele semblante lânguido de quem nada teme por estar num país tropical. Ficam parados por horas olhando pra Santa do chafariz (que é de fato belíssima), dizendo 'nice' apesar do mesmo estar desligado e sem água, comendo pamonha e tirando fotos. Fiquei sentada olhando prum grupo deles e reparei que alguns passantes ficam com vontade de alertá-los que aquilo ali é meio terra de ninguém à noite e que talvez fosse melhor guardar logo a câmera, mas ninguém se atreve de fato a chegar perto. Outra coisa interessante que acontece à noite é que os mendigos ficam mais visíveis e espaçosos, ocupando bancos que durante o dia não ocupam. Assim como certas coisas só se evidenciam de noite, outras, ao contrário, só vemos de dia, como é o caso de uma obra, próxima à saída do metrô, cercada por um tapume com motivos florestais, com cobras enroscadas em árvores, tucanos e vegetação densa. As pessoas (tipo esse casal da segunda foto) param ali pra tirar fotos, como se se tratasse de um monumento ou algo do gênero. Inclusive, durante o Festival Brasileiro de Cinema Universitário, que fez 15 anos agora e teve como identidade visual a valsa de um casal composto por uma debutante e um jacaré (numa menção às festas de 15 anos, aos filmes B e ao jogo do bicho), o ator que se passou pelo réptil fez vários passeios por ali. Chegamos até a pensar em, durante a oficina ‘circuitos de vídeo’, ministrada pela Paola Barreto como atividade paralela do Festival, fazer algumas imagens em lento zoom out, começando num plano bem fechado (simulando uma interação do animal com a mãe natureza), até abrir pra verdadeira selva do Largo do Machado, com seus mendigos (como o da terceira foto, no chafariz), meninos de rua e demais iniquidades que já estão tão naturalizadas que nem nos emocionam mais. Independente se vamos ou não realizar essas imagens, o fato é que o tapume já se adaptou à paisagem, assim como os pombos (que montam seus puleiros em cima dos pontos de ônibus), os pedestres e os postes. Quando estava saindo, rumo à Rua do Catete, reparei no banheiro da prefeitura (quarta foto) localizado quase em frente ao restaurante Gambino, movido a moeda de R$0,50, onde está escrito "esse sanitário é seu/faça xixi aqui". Esse também se adaptou à paisagem.

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